sábado, 21 de fevereiro de 2015

"Unidos pelo nacionalismo"

Nathalia Watkins, de Estrasburgo - Veja


A aversão ao liberalismo e o antiamericanismo da mulher que pode se tornar a próxima presidente da França são a prova de que a direita e a esquerda se encontram nos extremos


“A Rússia não é um agressor. Foram os Estados Unidos que criaram as condições para o conflito na Ucrânia”
“A Rússia não é um agressor. Foram os Estados Unidos que criaram as condições para o conflito na Ucrânia”      (Joel Saget/AFP)
Marion Anne Le Pen, chamada de Marine, é a favorita nas pesquisas para as eleições presidenciais de 2017 na França, com 30% das intenções de voto. Advogada de 46 anos, ela comanda o partido Frente Nacional (FN), fundado por seu pai, Jean-Marie, em 1972. Marine despacha três dias por mês em seu escritório no Parlamento Europeu, do qual é deputada, em Estrasburgo, na França. Na entrevista a VEJA, interrompida por baforadas em um cigarro eletrônico, ela se mostrou fortemente estatizante, antiamericana, protecionista e nacionalista. Embora situe no espectro de oposição à FN os políticos de esquerda (entre os quais os chavistas venezuelanos e os gregos do Syriza), ela não consegue esconder sua admiração por eles.
 
Podemos chamá-la de líder da extrema direita francesa?
A Frente Nacional não é um partido de extrema direita. Somos uma organização patriota, que preza o Estado-nação, o nacionalismo econômico, a independência diplomática em relação aos Estados Unidos e defende uma imigração controlada. Na França, a direita e a esquerda desenvolveram uma mesma e frouxa política. São responsáveis pelos mesmos números elevados de imigração. Por isso, a divisão entre esquerda e direita aqui não existe. É uma miragem. A verdadeira separação é aquela entre os que defendem a nação, como nós, e os que, em benefício do comércio global, advogam o desaparecimento das nações, a abolição das fronteiras e o fim das identidades nacionais.
 
O que a senhora acha da coalizão internacional, liderada pelos Estados Unidos, para combater o Estado Islâmico (Isis)?
A França está indo atrás dos americanos, que estão deslegitimados naquela parte do mundo. Eles são responsáveis pelo desequilíbrio da região, pela ascensão do Isis e do fundamentalismo islâmico. Quero a França com uma diplomacia independente. Antes, tínhamos reputação e influência. Isso foi perdido. Estamos submissos à diplomacia americana.
 
Os Estados Unidos devem mandar armas aos ucranianos?
Não. A Rússia não é um agressor. Foram os Estados Unidos que criaram as condições para a violência na Ucrânia. São os europeus que devem solucionar esse problema. Os americanos não têm nada que fazer em nosso território.
 
Seria melhor que os Estados Unidos não fizessem nada?
Eles deveriam parar de tentar ser os policiais do mundo. Se os Estados Unidos não ajudarem, como os ucranianos poderão se defender? Como não há agressão, não há do que se defender. São os ucranianos que estão bombardeando parte de sua população civil. O resultado das conversas diplomáticas deve incluir a federalização da Ucrânia, mas para isso é preciso um compromisso de que Kiev não se junte à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Isso é desejo dos americanos, que querem, por meio da Otan, abrir frentes até a fronteira russa, o que é inadmissível para Moscou.
 
O papel da Otan não seria impedir ou pelo menos retardar o expansionismo de Putin?
A Otan não tem razão de existir. Depois do fim da União Soviética, essa entidade deveria ter sido dissolvida. Em vez disso, ela se tornou uma arma nas mãos dos Estados Unidos. A Rússia e Vladimir Putin, por outro lado, não têm nenhuma pretensão expansionista. Só o que fazem é responder a uma agressão dos americanos em sua zona de influência econômica.
 
O Brasil tem uma empresa energética, a Petrobras, que, por ser estatal, virou presa da corrupção. Não é um contrassenso defender a estatização hoje?
Acho que os governos precisam atuar a partir de uma estratégia, mas não digo que isso signifique estatizar tudo. É precisamente quando há pessoas que só pensam no próprio bolso e põem a mão em bens do Estado que se deve intervir.

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